Medicamentos podem ter alta de até 675% sem ferir regulação, aponta Idec

fonte: IA
Flavio Sartori

Estudo revela distorção entre preços autorizados e valores praticados nas farmácias; prática prejudica consumidor e levanta alerta sobre modelo de controle de preços

Um levantamento divulgado nesta quinta-feira (29/05) pelo Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec) aponta que o preço de medicamentos vendidos em farmácias pode subir mais de 675% sem infringir a regulação vigente no país. O estudo revela um grave descompasso entre o teto de preços fixado pela Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos (CMED) e os valores efetivamente praticados pelas redes farmacêuticas.

A edição de 2025 do levantamento, que está em sua quarta publicação, mostra que mesmo com o reajuste médio de 3,83% autorizado pelo governo federal no Preço Máximo ao Consumidor (PMC) — em vigor desde 31 de março — os preços nas prateleiras podem aumentar muito mais sem violar a legislação. Isso ocorre porque o reajuste é calculado sobre o PMC, que costuma ser muito superior ao preço real cobrado.

Um exemplo emblemático é o da losartana potássica, um medicamento amplamente utilizado para controle de pressão arterial. Embora o valor cobrado nas farmácias seja até oito vezes menor que o PMC autorizado, esse descompasso permite que o preço seja reajustado em mais de 675% sem ultrapassar o limite estabelecido pelo governo.

Outro caso citado na pesquisa é o do antibiótico Clavulin (Amoxicilina + Clavulanato de Potássio). Com PMC de R$ 422,86, o medicamento era encontrado por uma média de R$ 166,81 antes do reajuste. Como o reajuste é aplicado sobre o teto, as farmácias poderiam mais do que dobrar o preço de um dia para o outro sem descumprir a regulação.

Segundo o Idec, esse cenário enfraquece o papel do PMC como instrumento de proteção ao consumidor, já que não impede aumentos abusivos de preços — mesmo com uma regulação formal em vigor.

A pesquisa também denuncia a prática de concessão de descontos mediante o fornecimento do CPF do consumidor. Os dados mostram que, ao compartilhar o CPF, o consumidor pode acessar descontos significativos. No entanto, isso levanta sérias preocupações sobre transparência e proteção de dados.

“O desconto somente é calculado após o compartilhamento do CPF. Essa prática induz o consumidor a indicar um dado pessoal para ter acesso a um desconto significativo no valor do medicamento. É uma prática abusiva, sem transparência, que está em desacordo com o Código de Defesa do Consumidor e com a Lei Geral de Proteção de Dados”, afirma Marina Paullelli, coordenadora do programa de Saúde do Idec.

Nos medicamentos de marca, a diferença média entre o preço com desconto e o PMC foi de 55,65%. No caso dos genéricos, essa disparidade saltou para impressionantes 160,38%, revelando um mercado fortemente inflacionado e dependente da coleta de dados pessoais para concessão de preços mais acessíveis.

O Idec alerta que essas distorções comprometem o acesso da população aos medicamentos, especialmente em um país onde grande parte dos gastos com remédios é feita diretamente pelas famílias. “Quem continua sendo o mais afetado é o consumidor, já vulnerável por uma questão de saúde”, ressalta Marina.

O estudo recomenda a reformulação do modelo de regulação de preços da CMED. Entre as sugestões estão maior transparência nos custos de produção, critérios de precificação mais adequados à realidade brasileira, e ampliação da participação social no processo. Essas propostas fazem parte da campanha Remédio a Preço Justo, conduzida pelo instituto.

Metodologia da pesquisa

O levantamento analisou preços em cinco das maiores redes de farmácias com presença em São Paulo, buscando minimizar distorções fiscais regionais. Foram estudados 20 medicamentos — tanto de marca quanto genéricos — com base em critérios de prevalência no mercado. A pesquisa também examinou diferenças de preços antes e depois de descontos aplicados mediante compartilhamento de CPF.

O Idec afirma que, enquanto a atual regulação não for atualizada para refletir a realidade do mercado, os consumidores seguirão desprotegidos diante de aumentos expressivos e muitas vezes injustificáveis nos preços dos medicamentos.


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