Inovação e Impacto Social: jovens transformam TV Boxes em ferramenta contra a evasão escolar

fonte : divulgação

Flavio Sartori

Em um cenário onde a tecnologia avança a passos largos, a inovação não se restringe apenas a grandes corporações ou centros de pesquisa renomados. Por vezes, as soluções mais impactantes emergem de iniciativas locais, impulsionadas pela criatividade e pelo engajamento de mentes jovens. É o caso de um projeto notável desenvolvido no Instituto Federal de Educação Ciência e Tecnologia de São Paulo (IFSP), campus Salto, onde um grupo de alunos, sob a orientação de um professor, transformou TV boxes apreendidas pela Receita Federal em um sistema de biometria inovador, visando combater um dos maiores desafios da educação brasileira: a evasão escolar.

Este projeto, que se destaca por sua originalidade e relevância social, não apenas oferece uma resposta tecnológica a um problema persistente, mas também exemplifica o potencial transformador da educação quando aliada à prática e à responsabilidade social. A iniciativa é um dos finalistas do prestigiado Prêmio Inova 2025, um reconhecimento que sublinha a importância de se investir em soluções que promovam a inclusão e a melhoria contínua do sistema educacional.

A ideia central do projeto, batizado de IFSPresente, partiu do professor Luís Henrique Sacchi, do Bacharelado em Ciência da Computação, que, juntamente com seis de seus alunos, concebeu uma solução computacional engenhosa. O ponto de partida foram TV boxes que, após serem apreendidas pela Receita Federal e destinadas ao descarte, ganharam uma nova vida e propósito nas mãos desses jovens inovadores.

Os alunos desempenharam um papel crucial na descaracterização desses aparelhos, removendo o sistema Android pirata e instalando o Linux, acompanhado de softwares úteis. Essa transformação não foi meramente técnica; ela representou um exercício prático de engenharia reversa e adaptação tecnológica, onde os estudantes puderam aplicar conhecimentos teóricos em um contexto real e com um objetivo social claro. O resultado foi a criação do Mobi Dig, um módulo de biometria que permite o registro da presença dos estudantes em sala de aula de forma automatizada e eficiente.

A participação dos alunos no desenvolvimento do IFSPresente vai muito além da execução técnica. Eles foram protagonistas em todas as etapas, desde a concepção da solução até a sua implementação. A experiência de trabalhar com hardware reciclado, de adaptar sistemas operacionais e de integrar o Mobi Dig ao Sistema Unificado da Administração Pública (SUAP) do Instituto, proporcionou-lhes um aprendizado prático inestimável. Essa imersão em um projeto com impacto direto na comunidade escolar não só aprimorou suas habilidades técnicas em programação e desenvolvimento de sistemas, mas também fomentou o pensamento crítico, a resolução de problemas e a consciência social.

O professor Luís Henrique destaca a importância dessa autonomia e engajamento: “É um processo de automatização da chamada”, explica ele, ressaltando que a solução desenvolvida pelos alunos simplifica uma rotina que antes era um desafio para os professores, que frequentemente enfrentavam problemas de acesso a notebooks e instabilidade de rede para registrar a frequência. A capacidade do Mobi Dig de funcionar sem energia e link de internet é um testemunho da engenhosidade e da praticidade da solução criada pelos jovens, tornando-a robusta e acessível mesmo em ambientes com infraestrutura limitada.

O IFSPresente transcende a mera automação de chamadas. Sua verdadeira relevância reside no potencial de combater a evasão escolar, um problema crônico que afeta milhares de jovens no Brasil. O professor Luís Henrique enfatiza que, com uma base de dados confiável sobre a presença dos alunos, o Instituto pode criar “gatilhos de monitoramento, identificar alunos que estão em vias de evasão e buscar soluções antes de ele efetivamente se evadir”.

Essa abordagem proativa é fundamental, especialmente considerando os alarmantes índices de evasão na Rede Federal de ensino, que, segundo auditorias do Tribunal de Contas da União (TCU) em 2013 e 2024, alcançaram 41% nos cursos técnicos e 51% nos cursos de graduação em 2022. O IFSPresente, portanto, não é apenas uma ferramenta tecnológica, mas um instrumento de inclusão e de resgate de sonhos interrompidos, como bem resume o professor: “Uma carteira escolar vazia é um desperdício de dinheiro público e carrega um sonho que se interrompeu. É isso que o IFSPresente combate”.

O mérito do IFSPresente foi reconhecido com a sua seleção como um dos finalistas do Prêmio Inova 2025, uma iniciativa da Confederação Nacional da Tecnologia da Informação e Comunicação (Contic) e do Conselho Nacional das Instituições da Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica (Conif), com o apoio da Associação Brasileira de Telecomunicações (Telebrasil). A premiação, que ocorrerá durante o Painel Telebrasil nos dias 2 e 3 de setembro em Brasília, é um testemunho da relevância e do potencial de escalabilidade do projeto.

A visão do professor Luís Henrique é ambiciosa: viabilizar o projeto para todos os campi do IFSP, o que representaria aproximadamente 850 salas de aula. A expectativa é que, em um período de um ano a um ano e meio de desenvolvimento, seja possível instalar projetos pilotos em dois ou três campi. Essa expansão não só solidificaria o impacto do IFSPresente, mas também serviria de modelo para outras instituições de ensino que buscam soluções inovadoras para desafios educacionais.

O projeto é um exemplo inspirador de como a educação, a tecnologia e a responsabilidade social podem se unir para criar soluções significativas, transformando o que seria lixo eletrônico em uma ferramenta valiosa para o futuro da educação e dos jovens brasileiros.

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