O Perigo Silencioso do 'Aceitar Todos': Cookies Exponenciais e os Bilhões de Dados de Brasileiros Vazados

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Flavio Sartori 

O ato de clicar em “Aceitar todos” ao visitar um site, buscando apenas a conveniência de acesso imediato ao conteúdo, é um gesto automático e repetido por milhões de brasileiros diariamente. Contudo, por trás dessa aparente inofensivo, reside um dos mecanismos mais eficientes e discretos de coleta de dados, que tem contribuído para um volume alarmante de informações pessoais circulando .

Aceitar cookies significa permitir que um site armazene pequenos arquivos no seu navegador para lembrar informações sobre você. Eles podem ser úteis, mas também podem trazer riscos, dependendo do tipo e de como são usados”, afirma perito em segurança digital Wanderson Castilho Castilho.

O cenário brasileiro é de grande preocupação, conforme revelado por uma pesquisa da NordVPN. O país desponta como a nação com o maior volume de cookies vazados no mundo. O número saltou de 54 bilhões em 2024 para mais de 94 bilhões em 2025, representando um aumento de 74% em um ano.

Deste total alarmante, 7 bilhões de cookies expostos na dark web são de usuários brasileiros, e uma parcela significativa está ligada a gigantes da tecnologia. A pesquisa detalha que o Google lidera com 4,5 bilhões de cookies vazados, seguido pelo YouTube (1,33 bilhão), Microsoft (1,1 bilhão) e Bing (1 bilhão).

Para compreender a dimensão do risco, é fundamental distinguir os tipos de cookies. Esses arquivos, armazenados no navegador, registram informações de navegação e se dividem em três categorias:
1.Cookies Essenciais: São indispensáveis para o funcionamento básico do site, como manter um login ativo ou preservar preferências de visualização.
2.Cookies Persistentes: Permanecem no dispositivo mesmo após o fechamento do navegador, lembrando preferências para futuras visitas.
3.Cookies de Rastreamento: Utilizados especificamente para coletar dados com fins de publicidade, análise de comportamento e direcionamento de anúncios.

O especialista enfatiza que o risco não está nos cookies essenciais, mas sim no uso comercial e na falta de transparência dos cookies de rastreamento. “As pessoas não têm ideia da quantidade de informações que liberam naquele clique. E muitas vezes esses dados vão parar em empresas que o usuário nem conhece”, explica.

A Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) atua como um balizador neste contexto. Embora o Brasil não possua uma lei específica para cookies, a LGPD estabelece princípios como finalidade, necessidade e transparência para toda coleta de informações, incluindo os arquivos de rastreamento. Isso obriga os sites brasileiros a informar claramente quais dados são coletados, com qual propósito e com quem serão compartilhados.

Contudo, ao aceitar os cookies de rastreamento, o usuário perde o controle sobre o destino de suas informações. Os dados migram do site visitado para uma vasta rede de empresas de publicidade, análise de comportamento e plataformas terceirizadas.

Na prática, é como enviar uma foto para uma pessoa e ela encaminhar para outras dez, e essas dez para outras vinte. Depois que o compartilhamento começa, não há mais como controlar o destino dos dados”, alerta o perito.

A multiplicação de atores com acesso às informações eleva drasticamente o risco de falhas de segurança e vazamentos.

O motivo pelo qual o botão "Aceitar todos" é tão incentivado é puramente financeiro: os dados representam valor monetário. O botão é frequentemente desenhado para ser o mais visível, colorido ou de mais fácil acesso, uma tática conhecida como dark pattern. Essa estratégia visa induzir o usuário a fazer a escolha mais conveniente para a empresa, em detrimento de sua própria privacidade.

Para mitigar os riscos de exposição, Wanderson Castilho sugere a adoção de medidas simples e imediatas:
Priorizar a opção “personalizar cookies” e desativar especificamente os de rastreamento.
Utilizar navegadores ou extensões que ofereçam bloqueio de cookies de terceiros.
Realizar a revisão e limpeza periódica dos cookies armazenados.
Evitar o clique automático sem a leitura atenta das opções de consentimento.

Embora os cookies possam, de fato, aprimorar a experiência de navegação, a aceitação indiscriminada abre caminho para um rastreamento contínuo e, muitas vezes, irreversível.

O problema não é o cookie em si, mas o uso comercial agressivo que se faz dele. É um ecossistema inteiro lucrando com informações que o usuário entrega sem perceber”, conclui o perito.

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